Texto, que entra em vigor em junho, dá primeiro passo rumo à implantação de tecnologia de grande potencial

Fonte: www.jota.info
O Brasil é um dos países mais renováveis do mundo, falando especificamente do setor energético. É por isso que falar de transição energética, no caso do Brasil, é mais fácil quando nos comparamos com outros países fortemente dependentes do carvão e de outras fontes que emitem grandes quantidades de CO2.
Em nossa matriz elétrica temos 83% de renováveis, enquanto a média global é de cerca de 25%. Na matriz energética, temos 48% e a média mundial está ao redor dos 15%. E seremos cada vez mais renováveis. Não apenas porque temos um dos melhores ventos do mundo para geração de energia eólica em terra, mas agora também porque estamos dando passos cruciais rumo à implantação de uma tecnologia de grande potencial: a energia eólica offshore, ou seja, no mar.
No final de janeiro, o governo publicou o Decreto nº 10.946, que dispõe sobre a cessão de uso de espaços físicos e o aproveitamento dos recursos naturais no mar para a geração de energia elétrica a partir de empreendimentos offshore. Entendemos que este foi um avanço crucial para que o Brasil possa iniciar seu caminho na implantação de parques eólicos offshore com segurança para o investidor, o governo e a sociedade. Acreditamos que o decreto não apenas atende aos interesses públicos e coletivos como também é importante base para que o trabalho das empresas possa ser feito de forma planejada e organizada.
Num setor que está dando seus primeiros passos, essa segurança é fundamental, para que tanto empresas como sociedade e governo saibam quais são os critérios técnicos, exigências, obrigatoriedades de estudos e os órgãos que responderão e serão responsáveis por analisar, aprovar e formalizar o avanço de cada etapa dos projetos, que possuem complexidade maior do que os de eólica onshore.
O decreto só entra em vigor em junho deste ano. O Ministério de Minas e Energia (MME) terá então 180 dias a partir desse período para aprimorar as normas. Do ponto de vista da base regulatória o decreto é suficiente para começar o processo, o restante vem por portarias e resoluções, mas é preciso também desenvolver infraestrutura de linhas de transmissão e portos e isso leva um tempo.
Um dos grandes questionamentos que surgiu com o decreto diz respeito aos leilões: quando serão realizados, como serão etc. É sempre importante lembrar que para que os leilões sejam realizados é preciso haver declaração das distribuidoras sobre necessidade de contratação, então não temos como prever a quantidade de possíveis leilões no ano que vem. O decreto não tem agenda de leilões, pois isso vai depender da necessidade de contratação. O que sabemos é que podemos, sim, ver um leilão sendo realizado no próximo ano. Considerando o tempo para desenvolver a infraestrutura de transmissão, por exemplo, algumas empresas afirmam que seria interessante a realização de um A-7, assim haveria tempo para esses avanços.
Independentemente de haver ou não uma agenda de leilões, o que já se sabe é que o apetite do investidor e nosso potencial são enormes. Já temos 80 GW de projetos em análise no Ibama e o roadmap de eólica da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) mostra um potencial de 700 GW. Este é um potencial que costumo chamar de “infinito”, porque considerando a necessidade técnica de termos uma matriz elétrica diversificada, ninguém apostaria numa fonte única e jamais chegaremos a precisar de toda essa energia em nossos ventos marítimos.
É importante não esquecer do nosso potencial onshore de eólica que passa dos 800 GW. Resumindo: nosso potencial eólico, em terra ou no mar, não vai se esgotar. E isso é um trunfo e uma ferramenta de enorme valor na luta contra os efeitos do aquecimento global, devido a seu enorme potencial de produtividade com zero emissões de gases de efeito estufa e baixíssimo impacto ambiental.
Num futuro não tão distante, nossas eólicas offshore podem, ainda, estar atreladas à uma das indústrias que terão papel central na energia das próximas gerações, o hidrogênio. Os estados do Nordeste do Brasil, por exemplo, já cientes desta possibilidade, têm assinado acordos de cooperação que permitirão a produção de hidrogênio verde dentro de alguns anos, utilizando principalmente eólicas, com destaque para as possibilidades das eólicas offshore que, vale lembrar, são sempre projetos de grandes dimensões.
Gostaria de terminar este artigo lembrando e celebrando o empenho de todos os agentes envolvidos nestes primeiros anos para o desenvolvimento da eólica offshore no Brasil. Na ABEEólica já estamos discutindo os temas de offshore com as empresas e instituições desde 2018, de forma mais sistemática, sempre junto com o Conselho Global de Energia Eólica (GWEC), que tem sido um parceiro crucial para nos trazer as experiências de outros países e novos parceiros para estudos e trabalho.
Além disso, já formamos uma importante rede de empresas da cadeia produtiva desta indústria. Reconhecemos, ainda, o enorme esforço e dedicação do ministro de Minas e Energia, Bento de Albuquerque, de toda a equipe técnica do Ministério de Minas e Energia e das demais instituições envolvidas neste tema, todos comprometidos em debater o assunto em profundidade, sempre do ponto de vista técnico, fazendo o difícil trabalhar de unir estudos de outros mercados com as especificidades do cenário brasileiro. A fonte eólica já possui uma longa história de sucesso no Brasil com a utilização dos ventos em terra e agora, por meio do Decreto nº 10.946, começa uma nova fase com os ventos marítimos.
Estou certa de que tal decreto será um ponto histórico quando analisarmos o desenvolvimento da energia eólica offshore no Brasil, um documento que ficará marcado como um passo fundamental para o setor. Não tenho dúvida que, daqui a alguns anos, celebraremos nossos primeiros GWs de eólicas no mar e o Brasil, que já tem um dos melhores ventos do mundo para eólica onshore, passará também a ser conhecido pelo sucesso de suas eólicas offshore, tecnologia que é tida como essencial na luta para conter os efeitos do aquecimento global.